Policial faz a guarda da sede do Federal Reserve, em Washington
– KEVIN LAMARQUE / REUTERS
— É como um unicórnio, una criatura mítica que anda por aí — disse Maggie Kirchloff, analista da Wisdom Wealth Strategies, à Bloomberg. — Pode ser que exista, pode ser que apareça, mas não se sabe quando.
Se as taxas realmente começarem a subir este mês, em geral, seria uma boa notícia para os poupadores americanos e uma má notícia para os devedores lá. E aqui? como isso afeta a vida do brasileiro? O pesquisador do Ibre/FGV Marcel Balassiano explica essa relação e diz que o principal impacto da alta dos juros americanos no dia a dia das pessoas deve ser sentido por meio da alta do dólar e o consequente reflexo disso no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do país, que em 12 meses até agosto acumulava 9,53%.
POR QUE OS EUA PODEM AUMENTAR OS JUROS HOJE?
Manter a taxa básica de juros praticamente zerada é uma exceção na economia. Não é a regra. Juro zero é algo atípico, serviu para recuperar a força da economia americana. A elevação sinaliza uma normalização, que a economia se recuperou da crise, que cresce e que o desemprego diminui. E aumenta os atrativos para os investidores financeiros nos EUA. Mas a inflação ainda está muito fora da meta, que é de 2%, e isso pode ajudar a adiar a alta.
COMO A ALTA DE JUROS NOS EUA AFETA A ECONOMIA BRASILEIRA?
A alta dos juros nos EUA pode gerar uma fuga de capitais dos mercados emergentes. Não apenas do Brasil. Isso ocorre porque a elevação da taxa básica americana aumenta a atratividade dos títulos do governo dos Estados Unidos, que são de baixíssimo risco, provocando uma saída de dólares do país para investimento lá. Mas não é uma migração total. O Brasil, por exemplo, paga juros muito alto e isso mantém o capital especulativo. Apesar disso, com a menor oferta de dólares aqui o real tende a se desvalorizar. Consequentemente, a alta da moeda americana deve ser refletida na inflação, uma vez que os custos de importação e de uma série itens da cadeia produtiva serão elevados.
ESSA ALTA DO DÓLAR PODE OCORRER APESAR DE A MOEDA JÁ TER SUBIDO MUITO ESTE ANO?
Sim. A forte alta do dólar que tem sido observada é uma resposta do mercado financeiro à crise política e econômica brasileira. Ou seja, tem uma origem doméstica. O rebaixamento do Brasil pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P), que retirou o grau de investimento — um tipo de selo de bom pagador — do país complicou ainda mais o cenário no Brasil. Mas a decisão do Fed pode puxar o dólar um pouco mais para cima.
É POSSÍVEL PREVER QUANTO O DÓLAR POR CAUSA DO FED?
Não. A expectativa é de que haja uma alta mais forte de imediato, com uma estabilização em seguida. A crise e o rebaixamento já puxaram muito o valor do dólar para cima e, talvez, a elevação dos juros não gere um impacto tão forte.
É POSSÍVEL ESTIMAR UM VALOR PARA O CÂMBIO NO FIM DESTE ANO?
Provavelmente, o câmbio vai estar pior do que o projetado pela última pesquisa Focus, do Banco Central, divulgada na segunda-feira, que era R$ 3,70. Neste caso, a alta dos juros nos EUA já está contemplada, uma vez que a elevação ainda este ano já era dada como praticamente certa. Mas, como o valor previsto na pesquisa é uma mediana, pode ser que a cotação seja mais alta no fim de dezembro.
A BOLSA TAMBÉM VAI SENTIR A ALTA?
O impacto direto de curto prazo é no câmbio. A Bovespa pode sentir de forma pontual, registrando uma baixa localizada.
O MOMENTO É O MAIS ADEQUADO PARA O BRASIL?
A elevação da taxa de juros nos EUA não é um problema. O patamar muito baixo era uma exceção. E já se esperava que isso fosse acontecer. Mas não é o melhor momento para o país. A crise deixa o Brasil muito vulnerável. A forte desvalorização do real é fruto da crise. O risco país do Brasil, medido pelo CDS (Credit Default Swap, na sigla em inglês, uma espécie de seguro contra calote), está caminhando com o dólar.
QUAL PODE SER O IMPACTO NA INFLAÇÃO DE UM DÓLAR AINDA MAIS FORTE FRENTE AO REAL?
O Banco Central veio subindo os juros como forma de combater a inflação. A última vez que o IPCA fechou o ano dentro da meta do governo, que é de 4,5%, foi em 2009, com uma taxa de 4,3%. Desde então, está sempre perto do teto da meta, que é de 6,5%. Este ano, a inflação deve ficar na casa de 9,5%, por causa dos preços administrados pelo governo, que têm um peso de 25% sobre o índice. A alta dos juros pelo Fed deve pressionar ainda mais a inflação neste ano e em 2016, quando deve ficar na casa de 5,5%, mas cujas projeções vêm subindo.
O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu Comentário será exibido em Breve